09/12/2010

O dogma da Imaculada Conceição - Por Murad A

Para entender o dogma da Imaculada Conceição é preciso
refletir antes sobre quem é o ser humano diante de Deus.
A partir daí, ver o que Maria tem em comum conosco e o que ela tem de especial.
Uma graça original
Cada bebê que vem a esse mundo nasce com uma bênção divina. O Senhor nos cria para sermos felizes e colaborarmos na felicidade dos outros. Todos nós fomos criados em Cristo. Estamos marcados pelo sopro de vida do Criador e por uma Graça Original. Como nos diz São Paulo: Antes da criação do mundo, Deus nos escolheu em Cristo, para sermos, diante dele, santos e imaculados (Ef 1,4).
Cada um se desenvolve com o tempo, constituindo-se como pessoa no correr da existência. Aprende a amar e a ser amado, recebe a fé de outros e a assume como sua. É fascinante ser, até a morte, “aprendiz da arte de viver”. Somos limitados no tempo e no espaço e condicionados pela cultura onde nascemos e vivemos. Neste processo de aprender com a vida, até os erros são importantes. Muitos limites são reassumidos no futuro, como oportunidade de superação e crescimento.No útero da mãe, o feto está recebendo, em doses distintas, amor e desamor, acolhida e rejeição, afeto e violência. Somos todos solidários no bem e no mal. Ninguém começa sua vida a partir do nada. Pela fé, reconhecemos que somos parte de um grande projeto amoroso de Deus, que estamos marcados por sua Graça e pela corrente positiva de amor de tantos seres humanos que vieram antes de nós. Mas o mundo também tem violência, mentira e maldade, que contagiam cada pessoa que nasce. Ao começar a existir, já estamos sob ação de forças positivas e negativas, de vida e de destruição, e interagimos com elas.Há algo na nossa história pessoal, comunitária e planetária que danifica os belos projetos do Senhor. Não vem de Deus e é difícil localizar sua origem. Nós o chamamos: “Mistério do Mal e da iniqüidade”. Ele está espalhado na humanidade e repercute dentro de cada um. Pois não só somos seres finitos, chamados a evoluir com o Universo. Mas muitas vezes freamos este processo e nos negamos a crescer.

O ser humano dividido
Cada ser humano tem dentro de si muitos desejos, tendências e impulsos. Eles são bons, desde que integrados num projeto de vida. Por exemplo, cada um de nós necessita acreditar em si e exercitar sua liberdade, de forma a ser aceito e respeitado pelos outros. Esta é a forma básica do poder. A pessoa fraca, impotente, contribui pouco nas relações. De outro lado, o poder é perigoso. Um pai autoritário pode deixar muitas feridas nos filhos. Um político poderoso e corrupto prejudica a nação e faz aumentar a exclusão social. Outro exemplo: todo ser humano busca prazer, ao se relacionar, ao comer, ao se divertir. Uma das formas mais intensas de prazer é o sexual. A relação entre homem e mulher é bela e querida por Deus. Mas o sexo desequilibrado, sem afeto e respeito, produz individualismo e violência. Outro exemplo ainda: gostamos de nos vestir bem, ter as coisas para usar, possuir os objetos que tornem a vida mais prática. Mas quando esse desejo desordenado se torna consumismo, cria pessoas dependentes e apegadas às coisas, que chegam a arruinar a vida para comprar tudo o que encontram.
Temos dificuldades de integrar nossos desejos e pulsões, e colocá-los a serviço de um projeto de Vida. Os impulsos do poder, do ter, do prazer e tantos outros, atraem a pessoa para baixo e podem afastá-la de Deus. A teologia chamou essa divisão interna de “concupiscência”. Ela tem dimensões individuais, coletivas e culturais. Sabemos que a nossa liberdade está comprometida pelo pecado e precisa ser libertada. São Paulo lembra essa divisão interna que a gente vive, dizendo que muitas vezes nosso coração quer fazer o bem, mas acabamos fazendo o mal que não desejamos (Rom 7, 14-24). Somos seres fragmentados. Mas nós cremos na vitória da Graça de Jesus Cristo, que nos liberta de todas as cadeias (Rom 5;8 e 8,1-4). A “graça original” de Deus, que nos cria e nos salva, é mais importante e mais forte do que o Pecado Original, e nos ajuda a superar nossos pecados e falhas.
O “Pecado Original” não é um pecado em sentido estrito, mas em sentido analógico. Ou seja, não é um ato cometido livremente, contra Deus e o seu Reino, relacionado com a orientação fundamental e as atitudes da pessoa. Com esta expressão, reconhecemos que existe uma ausência de mediação de graça em cada um de nós e nas nossas relações. O Pecado Original não faz parte da essência do ser humano, mas de nossa atual condição humana, que sofre a ação do mistério do mal e da iniqüidade. Que o ser humano seja limitado e aprendiz, isso faz parte de sua essência de criatura. Que ele se deixe arrastar pelo mal e se negue a crescer no bem, constitui um paradoxo de sua condição atual.

A originalidade de Maria
O dogma da Imaculada Conceição afirma que o segredo de Maria, a perfeita discípula de Jesus, que respondeu a Deus de maneira total, tem sua raiz na Graça. Ela recebe do Senhor um dom especial. Nasce mais integrada do que nós, com maior capacidade de ser livre e acolher a proposta divina. O fato de Maria ser Imaculada não lhe tira a necessidade de crescer na fé, pois isso faz parte da sua situação de ser humano, que necessita aprender e evoluir.
Maria não nasce prontinha. Também é aprendiz da existência. Há momentos em que ela não entende o sentido pleno dos fatos e das palavras (Lc 2,49-50). E no correr da vida, Jesus a surpreende muitas vezes (Mc 3,31-35). Mas, diferentemente de nós, Maria trilha um caminho sempre positivo, sem falsos desvios ou atoleiros. Maria realiza sua vocação pelo caminho humano da fé, em meio a crises e dificuldades. Ela também teve que fazer correções de rota no correr da vida. Experimentou processos de mudança, de conversão. Não do mal para o bem, mas do bem para um bem maior.Maria é pré-redimida pelo Verbo de Deus. Ela recebe sua graça salvadora numa intensidade maior do que nós, o que lhe dá forças para integrar tendências e pulsões. Conquista assim uma inteireza admirável. Exerce melhor sua missão de perfeita discípula, educadora e mãe do Messias. Com maior liberdade interior, Maria desenvolve profundamente suas qualidades humanas e espirituais, tornando-se criatura santa, não fragmentada, dona de si, aberta a Deus. Portanto, o fato de ser imaculada não a torna menos humana. Ao contrário. Ela realiza a utopia da “nova humanidade”, do ser humano evoluído espiritualmente. A imagem de Maria imaculada necessita ser completada com a da peregrina na fé.

Maria imaculada e nós
Para alguns cristãos, que provam a fragmentação, a força do mal que os domina, a reincidência no pecado, a inconstância na fé, pode ser que Maria Imaculada não seja um modelo operativo próximo. Neste caso, eles podem recorrer ao exemplo de outros santos, que trilhando caminhos tenebrosos, fizeram esforços enormes de conversão e experimentaram uma mudança radical de vida. Para eles, Maria Imaculada não é ponto de partida, mas de chegada. Pois o Deus que cria do nada também recria a partir do caos e das trevas.
Maria Imaculada subverte nosso conceito de “privilégio”. Uma pessoa especialmente dotada, com beleza estonteante, inteligência invejável, saber conquistado, poder ou fama, tende a se distanciar dos outros, a subestimá-los, e a olhar orgulhosamente para si. O privilegiado se torna narcisista: “Espelho meu, existe alguém melhor que eu?” Maria, ao contrário, nos ensina que tudo o que recebemos é dom e se destina a ampliar a rede do Bem, a estender o Reino de Deus sobre a terra. O singular privilégio da Imaculada Conceição é um dom especial, ao qual Maria respondeu com maior intensidade ainda, colocando-o a serviço de Jesus e da humanidade. Tudo o que somos, temos e conquistamos de especial, visa contribuir na construção da “teia da vida”, na qual todos os seres estão intimamente relacionados e são interdependentes.

Fonte:
A. Murad, Maria Toda de Deus e tão humana. Paulinas.
Quadro: Imaculada, de Murillo

OS SINAIS DO SALVADOR - José Luiz Gonzaga do Prado

3º DOMINGO DO ADVENTO
I. INTRODUÇÃO GERAL
Quando dirigimos pelas estradas ou pelas ruas das cidades, encontramos muitos sinais de trânsito. Seria extremamente ridículo a pessoa parar o carro em frente a um sinal verde para admirar aquela cor. O resultado seria uma batida. E se a pessoa parasse para examinar se a placa é de latão ou de madeira, se os símbolos ou as letras estão bem ou mal desenhados? O sinal não é para ser admirado ou discutido, mas para ser entendido e seguido.
Fazemos isso frequentemente com as narrativas de milagres nos evangelhos. Chegamos a pensar que talvez Jesus tenha feito curas e mandado seus discípulos fazer curas como demonstrações de poder em favor dos que nele cressem. Estamos cansados de ver “igrejas” que curam a torto e a direito, não se sabe por quais interesses.
Depois do episódio dos pães no capítulo 6 do Evangelho de João, muitas pessoas vão à procura de Jesus. Ele as acolhe, dizendo: “Vocês me procuram não porque viram sinais, mas porque comeram e ficaram satisfeitos”. O que interessa não é a placa, mas o que ela indica; não é o milagre ou seu resultado, mas o que aquilo significa dentro da mensagem de Jesus.
No evangelho de hoje, reaparece a figura do Batista. Ele manda seus discípulos perguntar a Jesus se este é o Messias esperado e recebe de Jesus os maiores elogios.
A resposta de Jesus é indireta: fala dos sinais que estão acontecendo. Abrir os olhos aos cegos, soltar a língua dos mudos, abrir os ouvidos dos surdos, soltar os braços e as pernas dos entrevados, enfim, dar nova vida aos mortos é o núcleo da missão do Messias.
Nós não esperamos um simples curandeiro; esperamos o Messias, que dá nova vida à multidão cega, muda, surda, inválida, morta.
II. COMENTÁRIOS DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. I leitura (Is 35,1-6a.10)
O povo estava no cativeiro. Os inimigos tinham vazado os olhos de alguns, outros estavam mutilados, todos desiludidos e desanimados. O profeta canta de maneira espetacular a esperança de saída do cativeiro e retorno para a própria terra. Será para nós símbolo de uma esperança maior. O caminho da volta é o deserto, tal como o caminho da escravidão do Egito até a Terra Prometida. É um novo êxodo. O caminho é o deserto, mas a certeza da esperança faz do deserto um jardim.
A esperança é a força para a caminhada: nada de braços cansados ou joelhos cambaleantes, nada de medo, coragem! É Deus que vem para salvar! Se o caminho da liberdade e da vida é difícil, é um deserto, a certeza de que a salvação vem de Deus dá força e coragem e transforma o deserto em jardim.
Aí já não haverá cego, surdo, mudo ou pessoas com deficiência física. Estas não apenas vão andar por si: vão pular como cabritos; os mudos vão soltar a voz e cantar um hino. Acabou a cegueira, a mudez, a surdez, a invalidez a que eram submetidos no cativeiro; a libertação que chega faz a todos videntes, ouvintes, falantes, caminhantes, até saltitantes e agentes. Deixam de ser objetos, tornam-se sujeitos, senhores de si. Vivam!

2. II leitura (Tg 5,7-10)Depois de fazer fortes ameaças aos ricos (vv. 1-6), o escrito de Tiago parece se dirigir aos pobres. Para a gente sofrida e cansada, ele fala de esperança, paciência e resistência, confiantes na vinda do Senhor, juiz justo.
A comparação com o agricultor é clara. A certeza do agricultor de que a semente lançada na terra vai produzir frutos é que lhe dá segurança de esperar até o dia da colheita. A natureza não dá saltos, já dizia o antigo ditado, e o agricultor sabe bem disso: por isso, espera tranquilo e seguro.
A expectativa próxima da vinda do Senhor, justo juiz, significa a certeza da vitória da justiça, por mais que demore e por mais que a injustiça pareça prevalecer. Isso leva ao comportamento mais moderado e maduro de quem não se queixa dos outros, atribuindo-lhes os próprios males, mas aguarda seguro o verdadeiro juiz, que está às portas.

3. Evangelho (Mt 11,2-11)
João Batista tinha dito, no texto lido domingo passado, que depois dele viria um mais forte que ele, pronto para cortar e queimar as árvores que não estivessem produzindo e para abanar o cereal, guardar os grãos no celeiro e pôr a palha para queimar. Seria o juiz definitivo e implacável.
O que João ouviu falar de Jesus, entretanto, parece não corresponder exatamente a essa ideia de juiz rigoroso. Donde o sentido da pergunta que ele manda fazer a Jesus: é você mesmo ou virá outro para o julgamento definitivo?
João ouviu falar das curas, sem dúvida, e da compaixão de Jesus pelas pessoas, também pelos pecadores. A resposta de Jesus aponta para esses sinais. Ele primeiro veio salvar, libertar. As curas são sinais da solidariedade com os sofredores e do mais importante de sua missão: abrir os olhos a todos os cegos, mesmo aos que tenham olhos perfeitos; abrir os ouvidos a todos os surdos, mesmo aos que tenham ouvidos perfeitos; fazer andar e agir os inválidos, mesmo os que têm mãos, pés e pernas perfeitos; purificar todos os leprosos, tirar da exclusão social todos os “sujos” postos à margem; enfim, dar vida a todos os que vivem mortos.
Tudo isso se resume numa palavra: anun-ciar a boa-nova aos pobres. Alguém per-gun-tou certa vez por que se fala tanto em evangelizar os pobres, já que eles geralmente estão mais perto da fé do que os ricos. É que “evangelizar” significa levar boa notícia. E que melhor boa notícia há do que fazer os oprimidos ver, ouvir e agir, algo proibido na sua atual situação?
Muitos não gostam disso, de dizer que a missão de Jesus é levar boa notícia aos pobres, levar esperança e força aos que são o refugo da sociedade, abrir os olhos, os ouvidos, a boca aos que são proibidos de fazê-lo. Muitos se escandalizam com a afirmação de que Jesus veio para libertar os oprimidos. Mas Jesus termina: “Felizes os que não se escandalizam comigo!”
Depois que os discípulos de João se afastam, Jesus se dirige ao povo para falar de João. Pergunta inicialmente o que foram ver no deserto e responde: não foram ver um bambu agitado pelo vento, de um lado para o outro, nem alguém vestido com roupas finas. No deserto estava um profeta, mais do que um profeta, aquele que abre os caminhos. “No entanto, o menor no reino dos céus é maior do que ele.” Reino dos céus é o mesmo que reino de Deus, conforme está no texto paralelo de Lucas. Esse reino de Deus aqui se entende como a comunidade cristã. Assim, qualquer membro da Igreja do Novo Testamento é maior do que João Batista.
O reino sofre violência, diz o versículo 12, que segue o trecho do evangelho lido hoje e faz parte da mesma perícope. A afirmação soa um tanto misteriosa. Significa que a comunidade dos discípulos de Jesus é perseguida, vítima de violência? Parece, no entanto, que se trata da violência exigida de quem quer conquistar ou arrebatar2 o reino. É a práxis contra a entranhada mentalidade deste mundo e dos que o dominam. Não significa exercer essa mesma forma de violência, mas vencê-la com firmeza por meio do amor.

III. DICAS PARA REFLEXÃOSerá que estamos prontos para conquistar, raptar, como diz o texto evangélico, o reino de Deus?
A ação de evangelizar os pobres constitui o principal sinal de que Jesus é o Messias esperado pela humanidade. Evangelizar não é impor a alguém um conjunto de doutrinas ou submetê-lo a um enorme código de leis e regulamentos. Evangelizar é levar boa notícia, levar esperança e ânimo a quem precisa, aos pobres, aos sofredores, às vítimas deste mundo.
A um morador de rua, você não vai dizer que ele deve ir à missa todo domingo; você vai dizer que Jesus também era “trecheiro”, não tinha nem uma pedra onde encostar a cabeça.
A boa notícia para os oprimidos pode ser má notícia para os opressores, mas é a mensagem de Jesus. Quando ficamos com medo de magoar os opressores, não nos estamos escandalizando com Jesus?
É preciso saber combinar a ideia do juiz implacável, que separa o que presta – o grão – do que não presta – a palha, que vai para o fogo –, com a ideia daquele que vem curar a todos, abrir os olhos aos cegos, os ouvidos aos surdos e purificar os “sujos”, enfim, trazer boas notícias para os pobres.
Abrir os olhos aos cegos, os ouvidos aos surdos, a boca aos mudos, fazer os inválidos ficar de pé, com o entendimento disso como milagres ou manifestações de poder, em pouco ou nada modifica o nosso comportamento e a caminhada da humanidade. Quando essas coisas são sinais do objetivo de fazer todos se tornarem sujeitos, senhores da própria vida, já incomodam bem mais.
O reino sofre violência. Não é fácil a busca do reinado de Deus. O mais difícil talvez seja desembaraçar-se do reinado do dinheiro e de tudo o que ele oferece. “Só os violentos o arrebatam”, só os fortes raptam esse reinado.
Trata-se da força usada por João, o precursor, que preparou a vinda daquele que haveria de começar o reinado de Deus no mundo. Ele não era um ramo agitado por qualquer vento, nem vestia roupas chiques: era um profeta, já pela própria austeridade e firmeza, e mais do que um profeta, pois preparava os caminhos do Senhor.
Mais violento ainda foi Jesus, ao entregar-se livremente à morte de cruz a fim de rasgar os caminhos para uma humanidade nova. Essa sua violência e o mundo novo celebramos na eucaristia.
Advento não é preparação para comemorar o Natal. Advento é celebrar a chegada do Senhor e reunir forças para arrebatar o reinado de Deus.

Fonte: VIDA PASTORAL.

muindi wa mangala

“On Death and Dying“

The idea of death makes one aware of one's life, one's vital being – that which is impermanent and will one day end.   When ...