Introdução.
Há séculos, a santíssima virgem é honrada e venerada, na cidade de Turim, sob o titulo de CONSOLATA, no celebre santuário que lhe é dedicado. O bem aventurado José Allamano, fundador dos missionários e missionárias da Consolata, foi reitor do santuário pelo espaço de 46 anos; durante este tempo reacendeu a devoção à virgem Consolata em todas as categorias de pessoas. Devolveu novo esplendor ao santuário, renovando-o material e espiritualmente. Com a fundação do instituto dos missionários/as da Consolata acrescentou uma nova pérola à coroa da virgem. Allamano teve a firme convicção de que ‘O Instituto surgiu por vontade da Consolata’. A fundadora é ela. E nós a veneramos como padroeira e mãe. Trazemos o titulo da Consolata ‘como um nome e sobre nome’. O instituto é obra de Maria. Por isso, a solenidade da Consolata no dia 20 de junho é ‘nossa festa, nossa de maneira especial’.
A Devoção Mariana na Itália.
A devoção mariana encontra-se presente em qualquer época da espiritualidade cristã; não, porem, com as mesmas características e com a mesma intensidade. Se, no inicio do século XIX, a devoção mariana apresentava-se em proporções modestas, o confluir de diversos fatores provocou um crescimento significativo, a tal ponto, que no final do mesmo século, alcançou dimensões grandiosas. Entre estes fatores merece destaque a proclamação do dogma da imaculada conceição em 1854; as aparições; a fundação de congregações religiosas dedicadas a viver e propagar a devoção a Maria; as conversões de pessoas ilustres que passaram a divulgar tal devoção; as peregrinações. As praticas devocionais que adquiriram maior importância são o rosário e o mês de maio.
A devoção mariana era um elemento significativo da espiritualidade do século XIX. Vale para esta devoção, em particular, o que Stella diz a nível geral sobre as devoções, “o oitocentos, também sob este aspecto pode ser considerado como um século de transição, com persistência da religiosidade arcaica magicista e com a prevalência de orientações mais equilibradas da piedade individual e coletiva. As invocações mais comum eram as sugeridas pela própria ave-maria; minha mãe, mãe santa. Os títulos mais usados eram os da salve-rainha; boa mãe, mãe de misericórdia, mãe de todas as graças. Sobre o titulo de nossa mãe e mãe de deus, projetava-se a concepção de mãe, típica do sistema patriarcal oitocentista, modulada pela afetividade induzida pelo romantismo e matizada pelo papel de suprema autoridade atribuída ao pai pela legislação popular, mesmo no final do século, podiam ser encontradas dramatizações onde, no juízo final, cristo aparecia como o juiz sincero e Maira como representante, por excelência, da misericórdia divina.
A piedade mariana apoiava-se na dimensão filial e no tema da plena confiança, próprias do relacionamento do filho com a mãe. Não obstante as tendências apocalípticas e antiliberais que se faziam presentes, sobretudo na interpretação do significado e mensagens das aparições, verificou-se, ao longo e particularmente na segunda parte do século, uma progressiva purificação do culto mariano, fundamentando-o na mensagem de fé expressa na definição dogmática da imaculada conceição. O clima mariano penetrou em toda a igreja italiana e vitalizou os santuários, promovidos por eclesiásticos e leigos, seja em território urbano ou rural.
A Devoção à Consolata em Turim.
O santuário da Consolata é para Turim o principal centro de devoção mariana. Segundo uma pia tradição, quem propôs ao povo turines a devoção a nossa senhora Consolata teria sido são Maximo, bispo de Turim no final do século IV. O quadro, escondido nos subterrâneos da igreja de santo Andre durante o período iconoclasta, teria sido prodigiosamente encontrado pelo cego de Briançon em 1104. estudos recentes afirmam que uma tal versão dos fatos carece de fundamentação histórica e hipotizam que o culto à Consolata, sob o originário titulo de nossa senhora da consolação, se tenha gradualmente desenvolvido junto à igreja de santo André, a partir da chegada dos monges beneditinos, provindos da abadia da Novalesa, fugitivos à invasão dos sarracenos.
Hinos e crônicas escritos pelos mesmos monges testemunham que a vivacidade da devoção mariana nesta comunidade monacal, bem como o seu empenho para suscitar a devoção no povo circunstante. Precedentes a uma devoção especifica à Consolata e aos primeiros documentos referentes à capela ou santuário da Consolata, estes hinos e crônicas chamam a atenção para um elemento fundamental na devoção mariana que confluirá no santuário da Consolata. Os títulos que estes monges usam para referir-se a nossa senhora põem em evidencia a sua maternidade. Maria é, sobretudo, a mãe de Deus e mãe solícita pelo bem dos seus filhos.
O USO DOS TÍTULOS: Consolata, Consoladora e da Consolação.
A idéia da expressão piemontesa La Consola e o seu correspondente italiano La Consolata é a forma do particípio passado, do gênero feminino, e como tal tem uma significação passiva: ‘aquela que foi consolada’. Há diversos textos, hinos e representações sacras em que Maria é apresentada como a desconsolada que necessita de consolação. Segundo G. Gasca Queirazza (autor do ‘La Consola – La Consolata: il titolo caratteristico della devozione alla Madonna di Torin”) a denominação a ou de Consolatione (da consolação) seria a única de uso propriamente litúrgico e a que é habitualmente empregada nos documentos oficiais eclesiásticos e esporadicamente em outros documentos vários; o apelativo Consolatrix ou Consolatrice, (consoladora) encontrado pela primeira vez no final do século XVI seria predileto no estilo epigrafico e freqüentemente empregado nas exposições doutrinais e de tipo exortativo, quando se quer convidar os fieis à confiança em Maria; o titulo Consolata seria mais freqüente e praticamente o único usado para designar diretamente a igreja, a imagem e a própria virgem Maria na devoção turinesa.
Quando os turineses chamam nossa senhora pelo nome, se dirigem a ela com o titulo Consolata ou na expressão dialetal La Consolà. Consolata é, por diversas vezes, apresentada como aquela que é objeto de consolação. Ela foi consolada por Deus pai que a escolheu para ser a mãe do seu filho; é consolada pelo filho que a cumulou dos mais ricos dons na ordem da natureza e da graça; é consolada pelo espírito que a escolheu por esposa e a enriqueceu com os seus dons divinos; agora é consolada no céu porque é a rainha do universo. Tendo tomado o nome da virgem Consolata, o instituto missões Consolata, tem como fim consolar o próprio coração do nosso senhor Jesus cristo, realizando os desejos mais ardentes do seu amor. Neste caso, o uso do termo se dissocia daquela que é a perspectiva principal da sagrada escritura. Nesta, o termo, quando de alguma forma é referido a Deus, o apresenta como o consolador em relação aos homens necessitados de consolação e não vice-versa.
CONSOLATA: O Anuncio Que Busca Justiça E Alegria.
“Eu porei neles um sinal e enviarei os seus descendentes às nações, às ilhas longínquas, que nunca ouviram falar de mim e nunca viram a minha gloria, e anunciarão a minha gloria às nações.” . Essas são as palavras que se encontram na primeira parte das nossas constituições que tem como introdução a nossa vocação na igreja.
Pe. Allamano fundara em 1901 os missionários da Consolata (padres e irmãos), e em 1910 as missionárias da Consolata . Ele deu-lhes o mesmo fim especifico expresso no lema, ‘anunciarão a minha gloria aos povos’ (Is. 66,19) Este é um lema a mais para refletir quando falamos de Consolata. Várias questões perturbam-nos enquanto o lemos – porque Allamano escolheu esta frase de Isaias como o nosso lema? Por que não foi de outro livro de Isaias? O que significa esta frase no seu sentido original? Qual é a aplicação dela no dia de hoje?
A tradução bíblica (versão - A Nova Bíblia de Jerusalém) da frase que as constituições usam diz o seguinte: “Porei um sinal no meio deles e enviarei sobreviventes dentre eles às nações: e Tarsis, A Fut, A Lud, A Mosoc, A Tubal e a Java, às ilhas distantes que nunca ouviram falar a meu respeito, nem viram a minha gloria entre as nações. Estes proclamarão a minha glória entre as nações,...” (Isaias 66,19.)
Como explicar este pronunciamento encontrado em Isaias? Primeiramente, é ver o seu contexto em que se encontra esta frase. O que significa o sinal? As nações? Ver a gloria? Anunciar a gloria? Enviar? Etc.
A nossa primeira pressuposta é que muitos exegetas concordam que os vv. 18-24 provavelmente foram acrescentados como conclusão dos caps. 46-66, ou até mesmo do livro inteiro. Todo o trecho devia ser em verso e possivelmente foi desfigurado pela inserção da lista de nações do v. 19 e dos meios de transporte do v. 20 . Todas as nações serão convertidas e reconduzirão os dispersos de Israel a Jerusalém em oferenda a Deus? Mas é Israel que recebe as promessas eternas – e ai, como que é? Em nenhum outro passo do AT o universalismo e o particularismo se encontram tão justapostos. E os sobreviventes das nações, (cf. 45,20-25) são os convertidos? São ‘missionários’? E as noções enumeradas? Esta lista é adição que toma seus elementos de Ez. 27,10-13? As identificações prováveis são: Tarsis – Espanha; Fut – líbia; Lud – Lidia; Mosoc – frigia; Tubal – Cilicia?
O gesto de Javé de colocar um sinal entre elas é muito importante, embora não se diz que consiste este sinal, mas num contexto textual mais global é o equivalente do estandarte, da mão e da bandeira que segundo 11, 10-12, Javé levantava sucessivamente para convocar a diáspora. Mão e bandeira eram levantadas também com o mesmo objetivo, em 49,22. A finalidade deste sinal é, de fato, explicitada de imediato em 66,19a ‘e enviarei (a chamar) dentre elas ‘escapados-às-nações’ que, com toda evidencia, são israelitas e judeus. Por tanto, no uso estrito da palavra missionária, não há nenhuma, perspectiva missionária neste oráculo, como em nenhum outro do livro de Isaias.
O livro de Isaias é formado por um conjunto de 66 capítulos. Ai encontramos três livros de épocas diferentes, mas todos te em comum as situações de opressão e consolação. O 1º Isaias (1-39): esta profecia é do século VIII a.C. O grupo enfrenta conflitos com a monarquia e o império assírio. O 2º Isaias (40-55): no contexto do exílio, por volta de 540 a.C. O povo vive sob a tirania do império babilônico. E o 3º Isaias (56-66): surge em Judá, entre os anos 540 e 450 a.C. No processo de reconstrução de Jerusalém, o grupo profético denuncia a corrupção e a exploração das elites judaicas e do império persa.
O segundo Isaias reaviva a fé e a esperança do povo do voltar para Jerusalém: “saiam da babilônia, fujam dos caldeus. Anunciem isso com gritos de alegria, espalhem a noticia até os confins da terra. Digam assim: Javé redimiu seu servo Jacó.” (Is. 48,20). O ano 538 a.C, marca o fim do exílio da babilônia. O decreto de Ciro, imperador da pérsia, possibilita o regresso dos povos dominados. O livro do 2º Isaías. Termina com a descrição de como será a volta para Jerusalém e a garantia da presença de Javé nesta caminhada. (55,12-13). As pessoas exiladas voltam com o sonho de construir uma nova Jerusalém. Querem refazer a aliança com Javé e construir uma sociedade justa e fraterna, com água, bebida e comida para todas e todos. (54-55).
Mas os anos passam e nada de acontecer a salvação e a libertação prometidas por Javé. A elite judaica se alia aos persas na opressão e exploração do povo. O templo e a lei se tornam instrumentos eficazes na coleta dos tributos e impostos. A maioria da população especialmente a camponesa experimenta fome, miséria, desemprego, expropriação, falta de moradia, morte prematura e escravidão . Muitas pessoas caem na descrença, algumas abandonam a fidelidade a Javé e buscam outras divindades (57,3). Quando tudo parece perdido, ressurge uma luz. Um grupo, provavelmente formado por levitas e pessoas pobres, começa a reconstruir o sonho: “observem o direito e pratiquem a justiça, por que a minha salvação está para chegar e a minha justiça vai se manifestar”. (56,1).
A busca de realizar o direito e a justiça é a temática que é abordada por 3º Isaias. Os levitas são pessoas fieis à palavra de Deus e ao compromisso com as pessoas destituídas de dignidade. O capitulo 66, que nos concerne por excelência, começa com a direção do olhar de javé: “eu olho para o aflito e o de espírito abatido, e também para aquele que estremece diante das minhas palavras”. E ainda: “ouçam a palavra de Javé, vocês que veneram a palavra dele”. (Is. 66,2b.5)
A final, para quem é a mensagem de salvação? Para os outros povos? Para os ‘escapados-às-nações’ (v.19a), que são israelitas/ judeus? As nações, tantas vezes mencionadas, não intervêm como tais, mas sempre em relação com a presença de israelitas no meio deles. No v. 18, ‘as nações e línguas’ parece uma designação dos outros povos, os não israelitas / judeus. E é verdade que virão e verão minha gloria. (v. 18b). Ver / conhecer a gloria de Javé é uma expressão freqüente nos relatos ou oráculos de salvação para Israel no contexto de sua dominação por poderes estrangeiros. O próprio Javé o diz acerca dos egípcios no magno acontecimento da libertação. (Ex. 7,5; 14,4-18).
O v. 19a, ‘e enviarei” – o verbo enviar, shalah, em sua forma intensiva nem sempre significa ‘enviar’, mas também ‘enviar para chamar’. A idéia é de vida e não de ida. Ou melhor, o mensageiro ‘vai’ a alguém para ‘fazê-lo vir’. O texto não fala de enviar estes ‘escapados’ para irem agora às nações, mas o que Javé faz vir (a Jerusalém). São “escapados-às-nações”, expressão que se refere ao passado e não ao presente ou futuro: Equivale a dizer: ‘os que haviam escapado (em outro tempo) às nações. Essa convocação de Isaias do povo da diáspora é um tema que costuma ser entendido ‘missionariamente’ mas que é justamente referente ao resgate de Israel dentre as nações como aparece em (Is. 2, 2-4;11,10-16;25,6-10a etc.) .
Agora, em v. 19, depois da primeira parte, segue um longo parêntese, em que se mencionam algumas dessas nações onde os ‘escapados’ se haviam refugiado em seu momento. O importante é destacar a pluralidade e a grande distancia, para assim mostrar a capacidade de Javé de reunir.
O inciso ‘... que não ouviram noticias de mim nem viram minha gloria’ é uma frase relativo que concorda com o sujeito imediato – as ilhas longínquas e os povos citados – e não com ‘escapados’, substantivo que fica muito distante. Esta descrição das outras nações expressa, por sua própria ‘memória histórica’, baseada em sua experiência salfívica de Javé. Este parêntese explica retrospectivamente o v. 18a: as nações e línguas, no futuro, ‘virão e verão minha gloria /energia’. Como isto acontecerá?
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